sexta-feira, 15 de julho de 2016

O Sonho



Aproveitando o período de turbulência pelo qual está passando o funcionalismo do Rio Grande do Sul, com uma greve de 3 dias (somente por “coincidência” ser no período da marcha em defesa da Dilma, o “Mortadelão”) em resposta às medidas que o governo estadual vem tomando para buscar sanear as contas públicas, eu lembrei uma frase que me soou, no mínimo, estranha quando a ouvi. Um juiz federal, que também é professor e escritor de livros para concurso público, chamado William Douglas, falou sobre: "sonho de passar em concurso público". 

Foi quando eu me deparei com a seguinte questão, se um grupo de pessoas supõe que ser funcionário público é um “sonho”, um objetivo que para ser atingido é necessário de um investimento financeiro e pessoal que chega a durar anos, é sinal que as coisas vão de mal a pior. Causa muita estranheza para mim que pessoas acreditem que o estreito mundo da burocracia seja o mais elevado nível de reconhecimento social e garantia econômica. São pessoas que olham a sociedade de cima para baixo, sabe-se lá por quê. Todavia, de uma coisa há de se concluir: quando uma parte não muito pequena da sociedade sonha com cargos públicos, tal fato revela a falta de opção, a pobreza econômica e a visão social turva de uma nação.

Mas amigos, é perfeitamente compreensível entender por que uma boa parte estudiosa e universitária da população brasileira procura cargos públicos: “A iniciativa privada paga maus salários e os empregos, em sua maioria, aparentam não serem promissores”. Os salários de cargos públicos, à primeira vista, são atraentes. Porém, pouca gente se pergunta o preço dessa mania e por que muitos empregos privados são tão ruins.

O resultado da equação é relativamente simples: cerca de quase metade da renda nacional está nas mãos do Estado. Essa renda toda, obviamente, não é produzida pelo funcionalismo, que no país, é um verdadeiro exército de gente empregada, estável e cara. No entanto, mesmo que o cidadão comum pague uma carga tributária pesadíssima, eis o que se vê nos serviços públicos em geral: hospitais e escolas públicas caindo aos pedaços, papeladas e mais papeladas para resolver problemas burocráticos que poderiam ser simples e a corrupção, que em certos setores, se torna generalizadas. E seus efeitos são sentidos também na iniciativa privada: pouca acumulação de capital e poupança, salários baixos, escassez de bons empregos e empobrecimento geral. E o empresariado brasileiro virando refém de cargas tributaria absurdas e que somente tiram a competitividade e diminuem o salário da iniciativa privada. Além disso, temos uma categoria que para de trabalhar quando quer (greve) e não presta conta para a sociedade do que de fato faz à custa do dinheiro de impostos de todos.

Eu tenho muitos amigos que são funcionários públicos, sou filho de funcionários públicos e minhas considerações jamais são de caráter pessoal, analiso questões práticas e políticas, não deixo de reconhecer que muitos funcionários públicos trabalham e trabalham bastante, mas falo da essência da coisa, falo do que esta por trás de todo esse processo.

Se não bastasse o mercado ser exaurido por conta dessa estrutura estatizante, uma boa parte da sociedade guarda também um forte resquício mercantilista. A empresa privada brasileira pode ser competitiva e muitos brasileiros são grandes empreendedores. Porém, eles enfrentam toda uma estrutura institucional que parece odiá-los e os hostiliza a todo o momento. A mentalidade vigente na política e na economia brasileira não parece gostar de livre concorrência. Empresa privada que se dá bem é aquela que presta salamaleques ao governo e vive numa bizarra espécie de capitalismo sem riscos, dai o surgimento dos cartéis e de escândalos de corrupção que proliferam toda hora nos noticiários brasileiros. Olha o paradoxo, os lucros são privados e os riscos são públicos. É por isso que muita gente foge do ofício de ser empresário. Há toda uma sorte de dores de cabeça para realizar tal atividade: impostos altíssimos, fiscais da receita ou do trabalho corruptos, direitos trabalhistas altos e impagáveis, contas pesadas a pagar, sem contar as dificuldades inúteis para regularizar uma empresa. Até fechar um negócio se torna dispendioso. A despeito de ser o elemento motivador que gera a riqueza econômica do país, o empresário é estigmatizado como uma criatura exploradora e parasita, cuja atividade é uma "concessão" que o Estado oferece, como um mal necessário. As restrições burocráticas ao livre mercado são assombrosas e desestimulantes. Cabe acrescentar outras dificuldades graves: as reservas de mercado nas práticas empresariais, profissões, ofícios. E também privilégios em relação aos empréstimos, subsídios e incentivos fiscais que o Estado proporciona para certos empresários amigos do rei ou no caso atual, da rainha. A concorrência, neste caso, se torna desleal.

Querem outro exemplo disso: Quando o eleitorado vota inspirado no assistencialismo governamental. O retrato dessa anomalia são programas ao estilo da bolsa-família e demais subsídios aos chamados “usuários da assistência”. Na mentalidade da maioria dos nossos eleitores, o Estado deve ser como um pai, um coronel, um senhor de engenho, foi caridoso, deu de comer aos “famélicos da terra”. Ou seja, o Estado não é uma figura burocrática e impessoal. Ele tem sentimentos e vontade própria. Sua ação não se faz por conta das leis, para retribuir à sociedade o que recolheu em impostos, mas porque realiza um "favor", uma generosidade, uma boa ação ao povo pobre e oprimido. Assim pensaram os eleitores mais pobres que votaram em peso em Dilma Rousseff para presidente. Na mentalidade deles, o Estado não é uma entidade abstrata, porém uma figura personalizada, na pessoa do senhor Luís Inácio Lula da Silva. O mesmo se aplica ao chamado Prouni, ao subsídio que o governo federal dá aos estudantes pobres para ingressarem nas universidades, onde uma atriz fala com todo o orgulho possível: “Antes, medicina era coisa pra rico”, que nem um lacaio de senzala ou um menino de recados do Brasil colonial, a alegre atriz reproduz um pensamento secular de servilismo arraigado na população brasileira.

Mesmo a psicologia da criatura da propaganda do Prouni reflete um atraso civilizador:  Medicina, assim como funcionalismo público, não é uma atividade profissional como outra qualquer, dentro de uma nação capitalista e democrática. É uma outorga governamental, um status bacharelesco, que a distingue dos seres mortais, tal como os nobres do Antigo Regime. Por mais que o governo jorre dinheiro para universidades de péssima qualidade, inclusive, sendo que a maioria delas tenha as piores notas no ENADE (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes), o importante não é ter cultura intelectual séria, mas sim distribuir diplomas a granel, inflar as estatísticas governamentais e formar centenas de milhares de bacharéis analfabetos funcionais.

E essa é a lógica do funcionalismo público como um sonho de consumo de quem prefere utilizar a sua capacidade intelectual, não em “Servir ao público”, mas em função de uma “Estabilidade” que vai garantir a tão sonhada tranquilidade para que esse profissional não tenha com o que se preocupar, independente de seu desempenho profissional. E isso cria um problema muito sério, pois, para cada profissional sério, dedicado e competente, existe uma legião de pessoas que se acomodam em suas funções e com não podem ser tocadas e que acabam não sendo avaliadas em suas funções e causando desequilíbrio na gestão do estado. A culpa desse desequilíbrio não é do funcionário público e sim do funcionalismo, ou seja, da forma deturpada com a qual gerações de políticos brasileiros vem alimentando durante séculos nesse País, isso é o que penso e penso também que está na hora de trazer para a discussão política uma reforma profunda no sistema funcional brasileiro, inclusive para proteger os funcionários públicos competentes e que, de fato, tem compromisso com o “servir ao público”, esse é o meu sonho!

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