sexta-feira, 17 de julho de 2015

Gramsci e a esquerda democrática

Durante seu período de cárcere, Antonio Gramsci estava muito impressionado com a violência das guerras que o governo revolucionário russo teve para submeter  a sua sociedade ao comunismo, pois a sociedade russa, apegada que era  aos valores e práticas de uma velha cultura.  A resistência de um povo extremamente religioso e conservador a um regime que se afirmava destinado a lhe trazer o “paraíso terrestre”, colocou em risco a estabilidade do governo soviético durante mais de uma década, ameaçava acabar com a possibilidade de que o sonho de uma nação comunista pudesse se tornar realidade na antiga União Soviética.

Percebendo esse problema e com o tempo necessário para pensar sobre ela, Gramsci concebeu uma dessas ideias fantásticas, que, de acordo com Olavo de Carvalho, "só ocorrem aos homens de ação quando a impossibilidade de agir os compele a meditações profundas": 

Mas qual ideia seria essa? Muito simples, começar a "adestrar" o povo para o socialismo antes de fazer a revolução!!! Fazer com que todos pensem, sintam e ajam como membros de um estado comunista enquanto ainda vivendo num quadro externo capitalista.

 Assim, quando viesse o comunismo, as resistências possíveis já estariam neutralizadas de antemão e todo mundo aceitaria o novo regime com a maior naturalidade, como parte de sua cultura, sem a necessidade do emprego de força para que isso aconteça, a estratégia de Gramsci era quase que uma inversão da ótica leninista, na qual uma vanguarda organizada e armada tomava o poder pela força, autonomeando-se representante do proletariado e somente depois tratando de persuadir os apatetados proletários de que eles, sem ter disto a menor suspeita, haviam sido os autores da revolução. 

Aqui novamente cito uma frase que se encaixa perfeitamente com a situação que quero colocar, que é outra frase de Olavo de Carvalho: "A revolução gramsciana está para a revolução leninista assim como a sedução está para o estupro". Entendeu? Não? Simples, em vez de utilizar da truculência revolucionária, Gramsci buscava conquistar as massas de uma maneira bem mais suave e profunda e para poder realizar isso, Gramsci estabeleceu uma distinção, das mais importantes, entre "poder" (ou, como ele prefere chamá-lo, "controle") e "hegemonia". 

O "poder" ou o "controle" é o domínio sobre o aparelho de Estado, sobre a administração, o exército e a polícia. 

A hegemonia é o domínio psicológico sobre a sociedade. 

Lenin buscou tomar o poder, para assim conquistar a hegemonia, Gramsci, busca justamente fazer o inverso, conquistar a hegemonia para ser levado ao poder suavemente, sem alardes e utilizando as chamadas "vias democráticas". 

Eu não preciso ser um gênio para dizer que o poder, fundado numa hegemonia prévia, é poder absoluto e incontestável: domina ao mesmo tempo pela força bruta e pelo consentimento popular. isso é possível, muito em função de uma extensa campanha de repetição de conceitos e de "verdades", construindo gerações de "autômatos mentais", que não se permitem a esses cidadãos, a capacidade de ter pensamento próprio e fugir da máxima que é colocada por quem detêm o poder.

Um governo revolucionário aos moldes do leninismo busca a repressão, através da violência as idéias que sejam diferentes das suas.

E ai vem a grande inteligência de Gramsci, pela sua estratégia, se espera chegar ao poder quando já não houver mais idéias que sejam diferentes no repertório mental da sociedade,é importante lembrar que Gramsci era um fã de carteirinha de Maquiavel e usou as idéias de seu conterrâneo de acordo com os seus interesses e sua realidade, em vez de um líder revolucionário (ou um "condotierre" como escreveu Maquiavel, que para chegar ao poder, utiliza de todos os meios e sempre com a aparência de um salvador da pátria), Gramsci prega a utilização de uma entidade coletiva, o que ele chamou de "vanguarda revolucionária".

Com isso, Gramsci faz com que o partido (vanguarda revolucionária) seja uma espécie de "Príncipe" maquiavélico, com um detalhe importante, o "condottiere" da Renascença não tinha apoio senão de si, e tinha de suportar sozinho os conflitos entre consciência moral e ambição política, encontrando no patriotismo uma solução de compromisso. 

Já na "vanguarda revolucionária", a produção de controle da consciência das massas é trabalho da equipe, e nas fileiras de militantes há sempre uma imensa reserva de talentos teóricos que podem ser convocados para produzir justificações do que quer que seja (na esquerda brasileira isso ficou muito claro nos partidos que se diziam apenas socialistas e que respeitavam as regras democráticas) e isso funcionou muito bem desde que o pensamento gramsciniano começou a ser estudado e praticado pela esquerda brasileira, durante anos foi colocado no imaginário político brasileiro, que somente a esquerda buscava o chamado "bem comum" e que aqueles que defendiam idéias diferentes eram "Fascistas", "Nazistas" ou corruptos (minha geração cresceu com a ideia de que a direita era formada somente por militares e por políticos corruptos como Paulo Maluf);

Por isso não acredito nesse discurso de que não existe mais direita e esquerda, de que existe um grupo de esquerda democrática, que pensa somente em chegar ao poder através das vias democráticas, o pensamento esquerdista se baseia, dentre outras coisas, em uma intervenção do estado nos diversos segmentos da sociedade e não somente na economia (esse foi um erro terrível dos liberais que pensavam que, não deixando a esquerda controlar a economia, estariam preservando o capitalismo), mas na cultura, na imprensa, no comportamento, dentre outras coisas, muito cuidado com isso.


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