Em função da última visita do Papa Francisco à América Latina e com os pronunciamentos que sua santidade fez, voltou à tona uma enorme bobagem que há muito tempo, os terríveis "Males" do sistema capitalista e a confusão, proposital, feita pelo movimento de esquerda, de comparar o capitalista moderno com os antigos senhores feudais, que enriqueciam com o empobrecimento de seus vassalos.
Peça presente em todo o discurso socialista, essa "semelhança" foi uma criação daquela entidade que, para o guru da esquerda moderna Antonio Gramsci, era a principal inimiga do processo revolucionário: A Santa Madre Igreja.
Mas, vamos analisar os fatos, conforme escreveu Olavo de Carvalho, lá em 1998: Desde o século XVIII, e com freqüência obsessivamente crescente ao longo do século XIX, isto é, em plena Revolução Industrial, os papas não cessam de verberar o liberalismo econômico como um regime fundado no egoísmo de poucos que ganham com a miséria de muitos..."
Porém, para que os ricos consigam enriquecer ainda mais às custas do pobres, é necessário que se tenha um quadro econômico completamente estático, na qual uma quantidade fixa de bens e serviços tem de ser dividida como uma bolha de plástico que, uma vez cheia, não cresce mais.
Foi com base em uma analogia como essa, que no século XIII São. Tomás de Aquino, com muita propriedade, condenou os juros como uma tentativa de ganhar algo em troca de nada.
Numa economia estática como a economia do sistema feudal, ou mais ainda na sociedade escravista clássica (Grécia e Roma), o dinheiro, de fato, não funcionava como força produtiva, mas apenas como um atestado de direito a uma certa quantidade genérica de bens que, se vão para o bolso de uns poucos e, obviamente, saem do bolso de outros muitos.
Dai podemos concluir que a concentração de dinheiro nas mãos do senhor feudal só servia mesmo para lhe dar meios maiores para ele explorar aqueles que não possuíam a mesma condição de dinheiro, lembrando que, cito aqui economia estática pré-capitalista.
Só que em meados do século XVIII em diante, e sobretudo no século XIX, o mundo europeu já vivia um momento de economia em desenvolvimento bastante acelerado, onde a função do dinheiro tinha mudado radicalmente sem que algum Papa, nesse período, desse o menor sinal de perceber essa mudança.
Nesse novo cenário, ninguém podia acumular dinheiro embaixo da cama para acariciá-lo de madrugada entre delírios à la "Tio Patinhas", mas tinha de apostá-lo rapidamente no crescimento geral da economia antes que a inflação corroesse todo o poder aquisitivo desse dinheiro.
Em suma, se algum capitalista idiota resolvesse fazer a besteira de investir na pobreza da sociedade, ele estaria apostando em sua própria falência!!! (Detalhe importante para analise).
Voltemos ao querido Tomás de Aquino, que, sempre com uma lucidez divina, conseguiu distinguir a diferença entre o investimento e o empréstimo, dizendo que o lucro só se tornava lícito no primeiro caso, pois isso implicava em uma participação em um negócio, com risco de perda, enquanto o sujeito que emprestava dinheiro, ficava esperando, com toda a segurança, esse tipo de sujeito deveria ter o direito, apenas e tão somente, à restituição da quantia emprestada, nada a mais do que isso.
Esse raciocínio de Aquino, na economia do século XIII, era mais do que óbvio (aquela coisa que todo mundo enxerga depois que alguém mostra que existe)
Só que, no cenário da economia capitalista, mesmo o puro empréstimo sem risco aparente já não funcionava como antes e nem mesmo os banqueiros, que viviam essa mudança no seu dia a dia e aliás viviam dela, foram capazes de explicar ao mundo em que é que ela consistia.
Eles notavam, na prática, que os empréstimos a juros eram úteis e imprescindíveis ao desenvolvimento da economia, que portanto deviam ser alguma coisa de bom, parece obvio, não?
Mas, sem saber como formular teoricamente a diferença entre essa prática e a do senhor feudal só podiam se vê como pessoas que viviam da Usura, condenados portanto pela moral católica, lembram-se do que disse Aquino?
A incapacidade de conciliar a moral católica e a utilidade prática tornou-se um enorme dilema do capitalista, contaminando de dualidade toda a ideologia liberal (até hoje todo argumento em favor do capitalismo soa como "coisa de adulto desiludido", realista e frio contra o idealismo pueril da juventude).
Marx explicou essa dualidade liberal pelo fato de que o capitalista ficava no escritório, entre números e abstrações, longe das máquinas e do material de trabalho (como se fazer força física ajudasse a solucionar uma contradição lógica, e aliás como se o próprio Karl Marx houvesse um dia carregado algum instrumento de trabalho mais pesado que uma caneta ou um charuto).
Mais recentemente, Mangabeira Unger, o sujeito esquerdista com maior inteligência que conheço, fez uma crítica arrasadora da ideologia liberal com base na análise do dualismo ético (e cognitivo, como se vê em Kant) que é a gênesis da esquizofrenia contemporânea.
Mas essa polaridade não era nada inerente ao capitalismo enquanto tal, e sim o resultado do conflito entre as exigências da nova economia e uma regra moral cristã criada para um tipo de economia que não existia mais (a coisa é um pouco mais complicada do que o senso comum da esquerda).
Foi ai que surgiu um sujeito que entendeu e teorizou o que estava acontecendo, e foi um sujeito sem qualquer autoridade religiosa ou prestígio na Igreja: o economista austríaco Eugen Böhm-Bawerk.
Este verdadeiro "gênio" notou que, no quadro do capitalismo em crescimento, a remuneração dos empréstimos não era apenas uma conveniência prática amoral, mas uma exigência moral legítima!!!
Quando empresta dinheiro, o banqueiro simplesmente trocava dinheiro efetivo, equivalente a uma quota de bens na data do empréstimo, por um dinheiro futuro que, numa economia em mudança, podia valer mais ou valer menos na data da restituição.
Do ponto de vista funcional, já não existia mais, portanto, diferença entre o empréstimo e o investimento de risco, percebem o detalhe importante???
Daí que a remuneração fosse tão justa no primeiro caso como o era no segundo. Tanto mais justa na medida mesma em que o liberalismo político, banindo a velha penalidade da prisão por dívidas, deixava o banqueiro sem a máxima ferramenta de extorsão dos antigos senhores feudais.
Um discípulo de Böhm-Bawerk, Ludwig von Mises, detalhou com mais clareza essa diferença pela intervenção do fator "tempo" na relação econômica: o sujeito que empresta troca dinheiro atual por dinheiro potencial, e pode fazê-lo justamente porque, tendo acumulado capital, está capacitado a adiar o gasto desse dinheiro, e que o sujeito que recebe o empréstimo necessita gastar imediatamente para tocar em frente o seu negócio ou sua vida pessoal (importante atentar para esse fato).
Von Mises provavelmente foi o economista mais filosófico que já existiu, mas, ainda um pouco carregado por resíduos do pensamento kantiano e nem se deu conta de que estava pensando em termos rigorosamente aristotélico-escolásticos: o direito à remuneração provém de que o banqueiro não troca simplesmente uma riqueza por outra, mas troca riqueza "em ato" por riqueza "em potência", o que seria loucura se o sistema bancário, no seu conjunto, não estivesse apostando no crescimento geral da economia e sim apenas no enriquecimento da classe dos banqueiros.
Quando determinadas medidas econômicas são utilizadas para, digamos, resguardar o sistema financeiro, a ótica esquerdista nos induz a pensar que é um protecionismo ao banqueiro em detrimento aos interesses da sociedade, quando na verdade, acontece justamente o contrário, se bancos começam a "quebrar", levam com eles toda a estrutura econômica da sociedade.
A concentração do capital para financiar operações bancárias não é portanto um malefício que só pode produzir algo de bom se for submetido as tais "finalidades sociais" (e em nome delas com interferência direta do estado), mas é, em si e por si, finalidade socialmente útil e moralmente legítima.
Com toda a humildade que posso ter, se Tomás, de Aquino lesse esse argumento, não teria ao que se opor e com toda a certeza teria nessa argumentação, um bom motivo para a reintegração plena e sem reservas do capitalismo moderno na moral católica.
O problema é que Aquino já estava debatendo com o Todo Poderoso e, no Vaticano, não apareceu ninguém que pareça de ter lido Böhm-Bawerk ou Von Mises, não somente no final do século XIX, como até os dias de hoje.
Por este motivo, a contradição grosseira das doutrinas sociais da Igreja, que, celebrando da boca para fora a livre iniciativa em matéria econômica, continuam a condenar o capitalismo liberal como um regime baseado no individualismo egoísta, coisa de opressor e terminam por favorecer o socialismo, que por sua vez agradece essa colaboração instituindo, tão logo chega ao poder, a perseguição e a matança de cristãos!!! (peço aos amigos de esquerda que antes de me chamarem de Fascista, estudem um pouco de História, tá tudo lá).
Volto aqui a usar um termo "batido", mas muito atual "Não se pode servir a dois senhores"
O que Leonardo Boff chamou de "o Reino de Deus na Terra", referindo-se a Ilha de Fidel, nada mais é do que uma contradição muito maior do que a que se apregoa sobre o capitalismo moderno ser "anti cristão"
Nesse raciocinio também, que o capitalista financeiro (e mesmo, por contaminação ou osmose, o industrial), se ainda tinha algo de cristão, continuasse a padecer de uma falsa consciência culpada da qual só podia encontrar alívio mediante a adesão à artificiosa ideologia protestante da "ascese mundana" (juntar dinheiro para ir para o céu).
Coisa que, convenhamos, fica dificl de ser levada a sério, assim como, o hábito de fazer generosas doações em dinheiro aos demagogos socialistas, que embora sejam ateus, sabem se utilizar eficazmente da moral católica como instrumento de chantagem psicológica, e ainda são ajudados nisto, pasmem, pelos textos de várias encíclicas papais.
Uma das causas que produziram esse erro católico na avaliação do capitalismo do século XIX foi uma consequência da Revolução Francesa (não por acaso, escrevo esse texto em 14 de Julho), onde foram saqueados e vendidos os bens da Igreja e que acabaram enriquecendo sujeitos que não tinham nenhuma moral e que acabaram produzindo aquilo que Balzac irá chamar em sua obra de "capitalismo selvagem".
O fato disso tudo ter ocorrido na França, marcou profundamente a visão católica do capitalismo moderno como sinônimo de egoismo anticristão, uma enorme bobagem, diga-se de passagem, pois não se pode estabelecer um saque revolucionário como sendo a prática predominante do capitalismo, se assim fosse, a França teria evoluído para o Liberal-Capitalismo e não para o regime de intervenção estatal que paralisa a economia (como acontece em terras tupiniquins) e que a deixou léguas atrás de Inglaterra e Estados Unidos na corrida para a modernidade e para o desenvolvimento econômico.
Todo governo que interfere na economia, que controla a maioria das empresas, que cria uma máquina burocrática arcaica e ineficaz, pode ser chamado de tudo, menos de um governo liberal-capitalista.
O tal capitalismo selvagem ocorre sempre quando existe uma intervenção direta do estado na economia e não no regime liberal (coisa essa, aliás, mais que visível no sistema cartorário, existente no Brasil), cabe, portanto, a todo aquele que defende uma economia liberal, onde o estado não seja o "Pai protetor", e ir de encontro a essa falácia esquerdista que a Igreja tem que ser "socialista", o crucifixo entregue por Evo Morales ao Papa Francisco chega a ser uma afronta à todos aqueles católicos que morreram nas mãos da ditaduras comunistas ao longo da História.
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