quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Por uma transição democrática

Terminado o processo eleitoral deste ano, as atenções se voltam para as perspectivas e os desafios dos novos gestores ao ocuparem o cargo de prefeito em seu município, em um ainda conturbado momento político e com um cenário econômico tão ruim quanto. Isso me fez recordar cerca de 14 anos, quando em 2002, último ano de mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, o país testemunhou um dos mais civilizados atos da democracia, a formação de uma Comissão de Transição que teve por objetivo, de forma transparente, entregar a máquina pública com um nível de conhecimento máximo sobre a situação dos direitos e obrigações que o novo governo Lula iria herdar.
No referido caso, o governo federal possuía uma amadurecida noção de Estado democrático, fruto da enorme veia democrática de seu dirigente maior. Fernando Henrique (críticas à parte), sempre foi um democrata por excelência e como tal, jamais deixaria que seus mandatos fossem maculados com qualquer desconfiança em relação a transparência e a lisura das contas públicas. O então governo que assumia, teve todo o acesso necessário para poder organizar sua gestão dali em diante.
 A pergunta que me faço hoje é: Esse mesmo espírito envolve os mais de 5.000 municípios espalhados pelo Brasil, após as eleições deste ano?
É relevante esclarecer aos gestores municipais que encerram seus mandatos neste ano, o cuidado que devem dispensar, principalmente em relação às prestações de contas dos acordos firmados com o governo federal. A gestão é impessoal, e como tal, deve primar pela transparência e pela total colaboração com a equipe de seu sucessor. 
Eu estou escrevendo essa postagem objetivo colocar em pauta as obrigações exigidas pelos órgãos de controle, tanto para o gestor sucedido quanto para o seu sucessor, recomendando ao final as melhores práticas para evitar responsabilizações administrativas futuras e garantir para a sociedade, total visibilidade do processo.
Mas como deve ser realizado esse processo de transição? 
Na esfera federal foi editada a lei nº 10.609, de 20/12/2002, que dispõe sobre a instituição facultativa de equipe de transição pelo candidato eleito para o cargo de Presidente da República. A equipe de transição tem por objetivo inteirar-se do funcionamento dos órgãos e entidades que compõem a Administração Pública federal e preparar os atos de iniciativa do novo presidente a serem editados imediatamente após a posse. Os membros da equipe de transição serão indicados pelo candidato eleito e terão acesso às informações relativas às contas públicas, aos programas e aos projetos do governo federal.
O Projeto de Lei nº 396/2007, em tramitação na câmara dos deputados, propõe que a equipe de transição administrativa seja mista, composta de participantes dos dois governos, com possibilidade de responsabilização dos membros da comissão por atos que culminem em queima de arquivo, danificação de equipamentos públicos e instalações, com todas as sanções administrativas cabíveis, além de multa e obrigação de reparar os danos causados, visando evitar tentativas de sabotar o novo governo. Diga-se de passagem que também é uma forma de resguardar o gestor que deixa o cargo, bem como, garantir que o processo seja de co-responsabilidade das duas gestões, a que termina e a que começa.
Para que haja exito nos trabalhos de uma comissão de transição, são necessários algumas atitudes minimas que devem sair do relatório realizado pela comissão, salientando a importância de que as câmaras municipais aprovem uma devida legislação para o funcionamento da equipe de transição
a) Composição de comissão mista de transição administrativa no período entre a proclamação dos resultados de eleição até quinze dias após a data da posse do chefe do poder executivo, quando incorrer reeleição; Quando a reeleição não ocorrer, sugere-se que a comissão encerre os trabalhos antes da posse do novo gestor.
b) Escolher um advogado com conhecimento em direito público e um contador especialista em finanças e contabilidade pública a fim de emissão de parecer e certificações quanto ao valor das receitas e dívidas municipais e outras questões que demandem o conhecimento desses profissionais;
c) A comissão mista de transição deverá elaborar relatório pormenorizado da situação de cada uma das unidades administrativas, órgãos e entidades, como quantidade de pessoal efetivo e em comissão, remuneração, bens móveis e imóveis;
d) Inventariar todos os convênios e outros instrumentos congêneres com a união, demonstrando a situação de cada um como prazo de vigência, atestando a existência ou ressalvando a ausência dos documentos comprobatórios da prestação de contas, a exemplo de notas fiscais, recibos, extratos de conta corrente, publicações em diários oficiais etc;
e) Toda a documentação produzida pela equipe de transição deve ser numerada, protocolada e possuir fé pública. Para garantir a total transparência das ações realizada pela comissão de transição, garantindo assim, a lisura necessária que a sociedade espera de uma troca de governo democrática.
A importância de constituir uma comissão de transição de governo nos municípios brasileiros é uma atitude que resguardará não somente os gestores sucessor e sucedido, mas toda a sociedade, que não será privada do benefício do repasse de outros recursos públicos, bem como não incorrerá em despesas extras decorrentes de simples desavenças políticas que podem ser amenizadas pelas recomendações expostas anteriormente.
A principal questão observada na atualidade é a instauração de Tomada de Contas Especial em razão da omissão no dever de prestar contas do ex-gestor, além de ação civil pública de ressarcimento ao erário.
A democracia se faz não somente com eleições, mas principalmente com as responsabilidades que cada processo eleitoral traz. A sociedade brasileira já demonstrou que não é mais mera expectadora dos processos políticos, ela exige uma responsabilidade cada vez maior dos seus representantes e não tolera mais irresponsabilidades e desrespeitos com a coisa pública. Eu tenho a esperança de que cada município consiga seguir o exemplo que nos foi deixado pelo governo Fernando Henrique Cardoso, lá em 2002.


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